O filósofo brasileiro, Mário Sérgio Cortella, define a ética de forma precisa, quando afirma que ética é o conjunto de valores e princípios que nós usamos para decidir três grandes questões da vida: “Quero?”. “Devo?”. “Posso?”.
Nos códigos de ética profissionais são especificados os direitos e deveres da categoria, ou seja, dentro da lógica de Cortella, o que é permitido e o que não é permitido, e assim sendo, registra em normas específicas, os valores que devem ser praticados pelo profissional, deixando claro o que é vetado no exercício da profissão e as possíveis punições no caso de desobediência ao código.
A Lei Federal n° 3.820/60, no seu artigo 10, alínea c, confere, explicitamente, aos Conselhos Regionais de Farmácia, o poder de “fiscalizar o exercício da profissão, impedindo e punindo as infrações à lei…” A fiscalização dos Conselhos é feita portando, por força de lei. É obrigatoriedade dos CRFs fiscalizar as atividades farmacêuticas prestadas à sociedade, e se não obedecerem essa determinação de fiscalizar estarão prevaricando no cumprimento da lei.
As Resoluções do Conselho Federal de Farmácia, obedecem aos ditames da Lei n° 3.830/60, e são expedidas para detalhar, desenvolver ou complementar aquilo que é estipulado em lei. Dentre essas resoluções o órgão supremo dos Conselhos Regionais, através seu parlamento de conselheiros federais, estabeleceu a Resolução n°596/2014, o Código de Ética Farmacêutica, que contém o regulamento ético do farmacêutico.
O Código de Ética Farmacêutica determina como falta ética, com muita propriedade, no artigo 14, alínea IX do Capítulo IV – Das Proibições: obstar ou dificultar a ação fiscalizadora ou desacatar as autoridades sanitárias ou profissionais, quando no exercício de suas funções.
Em casos excepcionais, os fiscais dos Conselhos e das Vigilâncias Sanitárias, no cumprimento dos seus deveres, dentro das suas atribuições de verificar as normas sanitárias e profissionais dos estabelecimentos, deparam-se com situações em que o fiscalizado procura obstaculizar, ou até mesmo impedir a efetivação da fiscalização, quer seja, com recepção intimidatória, desconhecendo ou tentando depreciar a autoridade fiscalizadora; provocando discussões desnecessárias sobre as sanções impostas com base legal; sonegando informações e documentos necessários à vistoria; negando o acesso do fiscal à empresa ou instituição ou até fechando o estabelecimento para evitar ser fiscalizado, enfim com várias formas de desrespeito tanto ao fiscal como ao órgão fiscalizador que ele representa, não deixando entretanto de registrar aqui, que o respeito deve ser mútuo entre fiscal e fiscalizado.
Os farmacêuticos que procederem assim, podem estar sujeitos as penalidades previstas no próprio Código de Ética Farmacêutica, tipificadas como transgressões medianas, podendo ser aplicada a pena de multa no valor de 1 (um) salário mínimo a 3 (três) salários mínimos regionais, que serão elevados ao dobro ou aplicada a pena de suspensão, no caso de reincidência, após, evidentemente, obedecidos os direitos de ampla defesa constantes em lei.
O mestre Arnaldo Zubioli lembra o aprendizado da ética como uma exigência desses tempos de incerteza e desafios, que só pode ser exercido, se houver na relação afetividade e respeito mútuo. Sob esse diapasão a relação fiscal/fiscalizado deve ser harmônica, sem a conotação negativa do fiscalizado de ver o fiscal com alguém que veio para apontar erros ou um mero impositor de multas e o fiscal ver o fiscalizado como como profissional desempenhando as atividades das ciências farmacêuticas de forma digna. Os regulamentos sanitários e profissionais só são criados por necessidade, para o bem estar da sociedade e as faltas éticas são exceções à prática, podendo, inicialmente serem caracterizadas nos termos de inspeção e/ou autos de infração, pelos inspetores desses órgãos.
O Conselho Regional de Farmácia do Estado do Maranhão – CRF-MA, criou através a Deliberação nº 021, de 31 de julho de 2020, o Departamento de Orientação Ética Farmacêutica, exatamente com a finalidade principal de orientar os inscritos em seus quadros, sobre os aspectos éticos, como meio de buscar o adequado exercício profissional, em defesa da sociedade.
O nosso objetivo nesta coluna “fiscalização e ética” é exercer essa atividade orientativa, descomplicando o entendimento das questões éticas e lembrando pontos muitas vezes esquecidos no cotidiano da vida profissional.
Finalizamos, lembrando novamente o filósofo Cortella, quando diz: É necessário cuidar da ética para não anestesiarmos a nossa consciência e começarmos a achar que tudo é normal.
Miguel Leda Dourado.
O Farmacêutico Fiscal decano do Brasil.